A ação de distribuição de cestas de alimentos do Programa Agro Fraterno no Amazonas chegou ao município de Autazes, localizado a 113 quilômetros de Manaus, nos dias 10 e 11 de junho. Foram beneficiados 1.520 produtores e as entregas ocorreram nas sedes da Associação Comunitária Agrícola de Terra Prometida (Acatep), Cooperativa dos Produtores da Região do Lago do Sampaio (Cooperasa), Cooperativa de Leite em Autazes (Cooplam) e Cooperativa de Produtores da Agricultura Familiar do Jatuá (Coopafja).
Regionalmente, a iniciativa tem a assinatura do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar-AR/AM) e conta com o apoio do Sistema Sepror (Secretaria de Estado de Produção Rural) e FPS (Fundo de Promoção Social), que viabiliza a logística de distribuição de cestas nas cooperativas. Nacionalmente, o movimento Agro Fraterno é liderado pela Confederação Nacional da Agricultura (CNA), em parceria com o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), a Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) e as entidades do Instituto Pensar Agro (IPA) e tem o objetivo de ajudar as famílias de trabalhadores e produtores rurais em situação de insegurança alimentar, atingidas pela grave crise gerada pela pandemia da Covid-19 e as enchentes dos rios, no caso do Amazonas.
A superintendente do Senar-AR/AM, Jeyn's Martins Alves, que participou da doação em Autazes, reforçou a importância do Programa e da união entre os agentes do setor agropecuário para amenizar a situação de vulnerabilidade que milhares de famílias estão enfrentando. "Esse movimento veio para mostrar união, solidariedade e para que as cestas pudessem chegar nesse momento de dificuldade. Eu sei que não vai resolver o problema, mas vem para atenuar o sofrimento. Estamos aqui justamente pelos produtores, que são os atores principais e a razão deste movimento Agro Fraterno ser criado", disse.
Graças a uma grande mobilização social, que contou com representantes das entidades envolvidas aqui no Estado e das cooperativas, milhares de famílias puderam ter um alívio diante de perdas e reacenderam as esperanças de dias melhores.
Josiel Marques da Silva, 26, que vive da plantação e de roçar terrenos, contou as dificuldades que tem passado atualmente. Ele faz um bico pra cá, outro pra lá, de roçadeira, e do que mais aparecer, e descreve a sensação de receber a cesta. "É uma maravilha porque nem todo dia a gente tem pra comprar e passa necessidade. Comecei uma plantação, mas ainda não tem como colher. Meu sonho é ter as coisas para comer, não passar necessidade. De vez em quando a gente passa, mas Deus vai dando força e a gente se põe de pé. Quando não tem trabalho, a solução é caçar".
Moradores de Terra Prometida receberam as doações de cestas que abasteceu mais de 300 famílias de produtores rurais em 8 comunidades indígenas mura
Beneficiada da comunidade do Lago do Sampaio, na sede da Cooperasa
Já a dona Maria de Souza Nascimento, 78, que mora no ramal do Bacuri e vive da agricultura de subsistência com a plantação de macaxeira e da criação de galinha e porco, conta que apesar de receber aposentadoria, falta muita coisa e é preciso administrar bem o pouco dinheiro que ganha. "Do meu dinheiro da aposentadoria eu tenho hoje (dia da doação) R$40,00 para passar o mês de junho. E pra vir pra cá, receber essa cesta, eu gastei R$20,00. Então eu estou feliz porque eu vou passar mais uns dias sem comprar fiado. Não é fácil, não. Pra mim é uma ajuda bastante grande, pois este mês, o que eu recebi foi só para pagar as coisas compradas fiado", descreve.
A família de Kesiane Oliveira Serudo, 27, que reside na vila do Céu, com 7 pessoas, sendo 4 crianças, o pai e o marido, conta que se viram como podem, mas com a realidade atual não têm como manter o mínimo necessário. "Não estava conseguindo comprar as coisas e estava passando uma dificuldade muito grande, porque são quatro filhos para alimentar. As crianças pedem e a gente tem que se virar. Recebo apenas o bolsa família, mas com quatro crianças é pesado. Como eu não posso sair para trabalhar, só almejava um emprego fixo para meu marido, porque assim não ia passar necessidade", disse a dona de casa.
Reflexos da Cheia Histórica no Amazonas
Quem mora na região já conhece o fenômeno da subida das águas dos rios e quem vive em áreas ribeirinhas sente na pele essa realidade todos os anos. Em 2021, na maior cheia da história, comunidades inteiras ficaram embaixo d'água e 58 de 62 municípios foram afetados.
Nessas condições, a logística da região que já é bastante peculiar, fica ainda mais difícil. Mesmo o município de Autazes que oferece acesso por via terrestre pela BR-319 e AM-254, ainda tem trajetos que são feitos apenas por balsas. Neste ano, especificamente, um trecho de mais de um quilômetro da rodovia federal está totalmente alagado, o que a equipe do Senar-AR/AM pode acompanhar de perto durante a ida de Manaus até Autazes.
Cheia muda paisagem da BR-319 e casas à beira da estrada ficam alagadas
Mas este é apenas um efeito da cheia, há outros muitos outros e o cacique Josenildo Pereira de Souza, 57, da aldeia Correnteza, descreve bem. "Nossas aldeias foram tomadas pelas águas, as casas de farinha foram para o fundo, as roças se perderam. Atingiu até as plantas frutíferas, laranjeiras, biribá, mesmo sendo plantas de terra firme, a água chegou até lá. Quase todas as nossas casas de farinha foram para o fundo. Tem uma situação da aldeia chamada Natal que ficou totalmente alagada", relata.
Houve uma perda econômica que é difícil ainda de precisar, principalmente para quem tem o mínimo para sobreviver. A grande maioria da população precisa de ajuda e conta com os auxílios emergenciais para superar este momento. "Normalmente temos a condição de produzir e nos sustentar, mas estamos praticamente dependentes destes auxílios, até que voltemos a ter as terras. A várzea dá uma sustentação muito grande, mas como está nessa situação aí, temos prejuízo porque passa do tempo de plantar. Então isso (doação de cestas) representa muito neste momento, em que não temos a produção necessária para o sustento dessas famílias", complementa o pajé Josenildo.
Maria Meiga Dias de Carvalho, 56, que mora na comunidade Murutinga, teve de sair de casa e buscar um lugar seguro para a família assim que a cheia chegou, e desde então, enfrenta o desemprego e as dificuldades para se manter. "Emprego assim é difícil. Meu esposo trabalha com roça e agora que está tudo alagado não tem como ele trabalhar. Nem um de nós é aposentado ainda, então, a gente conseguiu a casa do meu sobrinho cedida para ficar aqui durante a cheia. E toda ajuda é sempre bem-vinda", conta.
Em meio essa situação toda as famílias vêm utilizando do pouco que sobrou e da criatividade para superar as adversidades. "Atualmente, temos utilizado a canoa para fazer frete, alugar e contamos com a ajuda de nossos filhos que estão em Manaus", disse Maria.
Produtores amargam as perdas
Com o impacto das cheias para os empreendedores deste segmento, até a pequena indústria de laticínios da Vila Novo Céu, administrada pela Cooplam, registrou baixo estoque no período. “Quem tirava 100 litros de leite, está tirando 10”, conta Joyce Magalhães, agente de desenvolvimento do Idam.
Orleans Maia Chagas, 57, conta que ele e outros produtores estão totalmente afetados. "O meu leite vem direto para a indústria, mas no momento não tenho produzido nada. Tenho de comprar ração para os animais porque não tem pasto. Estamos pelejando para livrar os animais para ver se daqui pra agosto começa a melhorar um pouco mais", comenta.
Quando questionado sobre a importância da doação das cestas para a comunidade, ele explica que é mais do que apenas uma ajuda material, têm um impacto social e emocional. "A gente se sente feliz em ver que estamos sendo lembrados, não estamos esquecidos. E quando um alimento desse chega na nossa mesa, é mais um dia que temos".
Produtores de leite e agricultores de áreas ribeirinhas tiveram prioridade na entrega das cestas
Famílias de produtores rurais atendidas na sede da Coopafja
Cronograma de Entrega de Cestas
Em 2 de junho, o município de Iranduba recebeu da Federação da Agricultura e Pecuária do Amazonas (Faea) as doações do programa Agro Fraterno. E nas próximas semanas, será a vez de Manacapuru e Itacoatiara receberem as cestas básicas. A expectativa é de que ao final deste mês, 4.000 famílias sejam alcançadas no Amazonas.
Para conhecer mais iniciativas do Agro Fraterno, clique aqui